domingo, julho 29, 2012

LES DEUX PALAIS, UM CAFÉ COM 112 ANOS


Esqueça-se o cardápio e reverencie-se o ambiente. Não é todo dia que se vive a atmosfera de um lugar com 112 anos de história. Café, bar, restaurante, brasserie,  como a maioria dos cafés parisienses, numa esquina. Esta,  particularmente estratégica: Boulevard de Paris esquina com a Rue de Lutece, frente ao Palácio da Justiça e a Saint Chapelle. É o Les Deux Palais. Para alguns, de cozinha discutível,  muito boa para outros. Avaliações que dependem, antes,  do humor de cada qual. Ou dos garçons. O (humor) do que nos atendeu, mais para dos piores, profissional e meio de mal com a vida. A salada de atum,  fantástica e generosa, além de qualquer medida,  fez esquecer o aparente azedume do dito.





O ambiente remonta aos primeiros dias do café, preservando a decoração do ínício do século passado.  Em todos os muitos detalhes e nas curiosidades também. Como as toilettes, no subsolo, onde também estão três cabines de telefones, desativadas mas conservadas. Ou no WC masculino, com a maior de todas: uma latrina, dessas de “agachamento” (sem vaso sanitário), única opção aos mais apurados. Se em desuso,  ela sobrevive no Les Deux Palais como reverência e testemunho de muitas histórias, desdenhando a comodidade do vaso. A modernidade fica por conta de uma barra de segurança numa das paredes, supostamente para que o "cliente" tenha melhor apoio... Coisa de outro mundo, não?




E no restante, o clima de uma casa com muito a contar, particularmente por sua posição na geografia e proximidade a tradicionais pontos da cidade.







quinta-feira, julho 26, 2012

PASSANT, SOUVIENS-TOI!



A data de 17 de julho nunca me disse coisa alguma, exceto por, nesse dia, uns 30 e alguns anos atrás, ter nevado em Curitiba – desafortunadamente não vi, passei por ela  na véspera (eu ainda morava em Bento Gonçalves/RS). Tempos depois, adotando a cidade para viver, aprendi a cultuar o fato, como vendido pelas notícias, fotos e papos. Agora, num momento inesperado, acabo de descobrir que esse dia 17 de julho encerra muito mais, como data a ser lembrada pela humanidade.


Eram 9h30m da manhã e caminhávamos pelo Boulevard des Grenelles para apanhar o métro. Frente à estação Bir-Hakein, me dei conta de um jardim, pequeno e bem arranjado, abraçado por vários prédios. Uma esmerada estrela de Daví feita com flores, logo abaixo de uma grande placa, bouquets de flores em azul, branco e vermelho, tudo me trazia a consciência de um momento trágico: ali, em 17 de julho de 1942, o governo colaboracionista de Vichy, e sua polícia controlada pelos nazistas, prendeu e torturou 13.152 judeus, todos mandados depois para a morte em Auschwitz. Foi um momento forte e perturbador, para mim. Eu vivia a história onde e como acontecida.



Memoriais como esse se espalham por Paris e a França, e muitos outros cantos da Europa, contribuindo para reafirmar a crença nas possibilidades do Homem e na Paz.. Servem como mensagem de esperança às populações locais,  aos milhares de migrantes que aportam ao continente europeu, sacodem os turistas em seu aparente descomprometimento – não há como ignorar esses ícones. 

Em meu último dia em Paris, sexta-feira última, passeando pela Gare de l'Est – ela atende aos trens de alta velocidade -,enquanto esperava pelo trem que me levaria a Frankfurt,  me deparei com outro memorial. Ele assinala as atrocidades nazistas  e dos colaboracionistas, desde trabalhos forçados de jovens franceses à deportação de mais de 70.000 judeus - apenas 2.500 sobreviveram - sem esquecer de cantar a morte heroica de ferroviários na defesa da França.


Tudo para nunca ser esquecido.






segunda-feira, fevereiro 27, 2012

Um segundo é o tempo


Diz o Pedro que frente ao touro ele tem apenas um segundo para tomar decisões. A principal: atrair a atenção do bicho, quase 800 kg, em tempo de salvar o peão e salvar-se. Um segundo só para descobrir o momento em que o animal investirá para pegá-lo. A piscadela de olhos do touro é o sinal vai lhe dizer esse momento, o tempo para jogar-se ao chão, bem ao meio das patas dianteiras do animal, para safar-se. Conta com a sorte e a certeza de que o touro nunca desvia para os lados. Confio na história que ele me conta – nem sei se queria ouvi-la, mas ela foi a resposta a uma pergunta que rendeu trela para uma prosa diferente. Um papo de palhaço de rodeio, que é o que Pedro faz a maior parte da vida, e eu nunca ouvira antes, igual ou parecido.

Esse Pedro palhaço de rodeio, me surgiu pela frente como garçom, numa manhã de carnaval, num quiosque à beira-mar, em Guaratuba. Baixo, cafuzo, ligeiro e esperto. Conversador. Pedro manda chuva, manda sol, manda pedido, manda ligeiro, como se apresentou. Só podia, me passou pela cabeça, ser nordestino. Saiu de Sousa (Vale dos Dinossauros), sertão da Paraíba. Catou seus 8 irmãos, a mãe, tocou para o sul. Aportou em São José dos Campos, São Paulo, de onde parte para suas aventuras e venturas.

Sujeito apressado, tomou o tempo nas mãos logo aproveitando o pouco tempo que passa em São José dos Campos para fazer uma filha. O que fez em 30 segundos, me garantiu o apressado. Trinta segundos para ir “aos finalmente” com resultados... Cismo que Pedro está sempre com o touro na cabeça, um segundo pela piscada dele... É contra o tempo, por exemplo, que ele corre pela areia da praia servindo as mesas que atende.

Palhaço de rodeio, garçom, em algum lugar se transmudou em cabeleireiro, “de salão”, explica, diplomado... Em Fortaleza é locutor de horas vagas, tem até programa por lá. Me garantiu que fez a 8ª série, duvido mas não posso duvidar... Imaginei continuar o papo, mas Pedro não suportou encarar a quinta-feira de praia vazia. Abortara o plano de ficar até o final da semana. Sua quarta-feira de cinzas rendera só R$ 40,00, me contaram. A piscada de olhos do touro na cabeça, aquele segundo de adrenalina era sua hora de voltar atrás da fortuna prometida pelos rodeios. Como me dissera, tendo a sorte de se integrar a uma boa equipe de peões, pode tirar até R$ 500,00 por dia. A praia fica para o próximo ano.